terça-feira, 14 de junho de 2011

José Carvalhal - Recado ao Governo

Numa altura em que a intervenção de forças externas em Portugal é já uma realidade, através da denominada Troika (onde se insere o F.M.I.), são muitos aqueles que desesperam sem saber ao certo o que fazer para tentar travar uma crise que é já de dimensão europeia. Enquanto tal acontece, resta-nos o contentamento em saber que conservamos ainda a nossa independência, aparentemente garantida pela eleição de um novo Governo após o último sufrágio a que fomos submetidos. Seja qual for o destino da nossa governação, são já muitos os apelos ao sentido de responsabilidade de todos os responsáveis pela Nação em favor do bem comum, que se multiplicam de hora a hora, sejam eles efectuados de uma forma mais racional ou de uma forma mais desesperada.
Transpondo estas considerações (de índole quase utópica) para o panorama musical, aproveitamos para relembrar que os mesmos apelos que hoje são feitos através da blogosfera (ou através de manifestações espontâneas de gerações à rasca) são em tudo idênticos aos que surgiram de forma livre no imediato pós 25 de Abril, através da proliferação de dezenas de artistas provenientes de todos estilos musicais (desde os cantautores até ao próprio fado) que, de uma forma ou de outra, faziam ingerências e apelos muito directos à Governação.
Tal sucedeu, por exemplo em 1978, quando um desconhecido José Carvalhal gravou para a Editora Rapsódia (inserido numa série de EP's de cantares ao desafio e cânticos populares) o tema "Apelo ao Governo" que, bem vistas as coisas, permanece ainda bastante actual. Aliás, a importância destes discos, ao qual pouca gente atribui real valor, torna-se ainda mais evidente na época em que nos encontramos. De facto, versos expressivos como "Temos um país vencido por causa da politica / isso a mim me consome por ver tanta miséria / tendes os bolsos cheios e os pobres cheios de fome" transportam os ouvintes mais pessimistas para uma preocupante realidade que poderá estar mesmo aqui ao virar da esquina.
Pelo menos até 1984 (?) José Carvalhal, gravou mais de meia dúzia de discos, uns com uma vertente mais popular e outro com um carácter mais político, como é por exemplo o sugestivo disco gravado também em 1978 para a mesma editora com o título de capa "Com tretas não se governa". Podíamos estar enganados e pensar que José Carvalhal seria apenas um cantor de outros tempos e que estes discos de tempos idos que teimosamente continuamos a resgatar de destinos incertos, não voltavam a soar nos nossos giradiscos. No entanto, para espanto nosso, conseguimos apurar que ainda hoje José Carvalhal mantêm o estatuto de popular tocador de concertina e "cantador" ao desafio na freguesia distante da Ermida, no concelho de Ponte da Barca, aldeia quase deserta mas que teimosamente continua a sobreviver à desertificação total.


Clique no play para ouvir um excerto de Recado ao Governo

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Pancho & Kamel – Pedra Filosofal

Quando pensamos que a imaginação se encontra esgotada e que já não podemos surpreender ninguém com a descoberta de mais uma versão de uma canção conhecida, eis que nos chega às mãos uma inesperada e original interpretação do conhecido poema de António Gedeão “Pedra Filosofal”, imortalizado sob a forma de canção por Manuel Freire.
Já vários artistas portugueses gravaram esta canção, não fosse ela reconhecida por todos os quadrantes musicais como uma das mais belas canções alguma vez criadas por intérpretes portugueses. No entanto, desta feita socorremo-nos do duo Pancho & Kamel, composto por F. J. Amenabar (Chile) e Kamel Missaghian (Irão), dois artistas estrangeiros que (provavelmente) se encontravam a residir temporáriamente em Portugal e que tiveram a oportunidade de gravar este trabalho no nosso país para a etiqueta Riso & Ritmo, em data não anterior a 1970.
De facto, o "verdadeiro" nome deste duo é Dia Prometido, um duo psicadélico baseado em Espanha (acompanhado em estúdio com banda de suporte) com reportorio bastante eclético abrangendo versões instrumentais de temas rock, folk, world, jazz, clássica, além de temas originais.
Ao que pudemos apurar, os Dia Prometido lancaram quatro LP's e cinco Singles entre 1971 e 1975 pela Philips em Espanha, sendo este EP da Riso & Ritmo uma excepção, editado para o mercado português com a exclusividade do tema "Pedra Filosofal" que aparentemente não perfila em nenhum dos LP ou Singles da banda.



No aspecto musical, estamos perante um registo bastante simples, respeitando a linha da versão original, embora neste caso, a voz e a guitarra seguem acompanhadas do muito pouco usual santur, um instrumento milenar de origem persa, que ocupa um lugar de destaque neste tema, cabendo-lhe o registo da melodia da canção, passando a voz a ocupar um lugar declamativo.
Não podemos ficar igualmente indiferentes ao timbre exótico e sonoridade planante que o santur nos emana ao longo da interpretação de “Pedra Filosofal” que, juntamente com o facto de estarmos perante uma versão em castelhano, nos oferece uma interessante visão do poema de Gedeão, confirmando a dimensão universalista que só as grandes obras conseguem alcançar.



Clique no Play para ouvir um excerto da canção
Pancho & Kamel
RREP0089

1) Peace Meditation (Pancho & Kamel)
2) Pedra Filosofal (Antóneo Gedeão)
3) Improviso Persa (Pancho & Kamel)
4) Concerto de Aranjuez (Joaquin Rodrigo)