Apesar do mediatismo (e algum vedetismo)
proporcionado pela imprensa social da época a alguns cançonetistas, nomeadamente a partir da criação do Centro de Preparação de Artistas de Rádio
da Emissora Nacional, a grande verdade é que eram poucos aqueles que
se dedicavam exclusivamente à vida artística, dela retirando o seu
sustento. A grande maioria, mais não eram do que artistas amadores
que em determinado momento gozaram de alguma popularidade, através
de esporádicas aparições em programas de rádio e em alguns
Serões para Trabalhadores e que rapidamente se desvaneciam no
anonimato.
Como é fácil de compreender, tais artistas raras
as vezes conseguiam conciliar a sua vida profissional com a vida
artística. Os homens viam-na ser interrompida (muitas vezes para
sempre) pela obrigatoriedade do cumprimento do serviço militar. No
que às mulheres diz respeito, a vida artística, na maior parte dos
casos, não passava de uma mera experiência de meninas que precedia
a devoção à vida do lar antes do anunciado fim do percurso artístico. Aliás, o casamento foi mesmo umas
principais razões para que muitas artistas da Emissora Nacional
tivessem abandonado ou optado por um rumo diferente e mais reservado
na sua carreira. Dois exemplos supremos são, sem dúvida alguma,
Maria de Fátima Bravo (cuja voz se imortalizou na canção “Vocês sabem lá”) e Júlia Barroso (uma das primeiras vedetas
da rádio e a primeira rainha da Rádio, eleita pelos leitores da
popular revista Flama) que muito cedo abdicaram das suas carreiras
em favor do casamento. Outros exemplos poderíamos deixar aqui, mas
reservaremos os outros para uma próxima mensagem, uma vez que a que temos em mente para hoje tem por objecto uma outra
temática.
Conforme referimos,
também houve casos em que nomes mais ou menos conhecidos da nossa
rádio conseguiram conciliar a sua vida profissional com a vida
artística, mantendo a estabilidade dos seus empregos ao mesmo tempo
que seguiam cantando e gravando discos. Dois desses exemplos são
Maria de Pádua e Almerinda Stella, as quais partilhavam ainda uma
interessante coincidência: ambas eram funcionárias dos Correios e
ambas gravaram vários discos, seja em formato 78 rpm, seja mais
tarde em formato 45 rpm. Se relativamente a Almerinda Stella obtivemos
já a informação de que faleceu recentemente, o mesmo já não
poderemos dizer sobre Maria de Pádua, cujo paradeiro e informações
biográficas continuam a ser um mistério, dada a quase ausência de
registos escritos na imprensa da época sobre tal artista. Nem mesmo,
através do contacto com alguns artistas da década de 40 e 50
lográmos obter qualquer informação sobre o paradeiro de Maria de
Pádua.
Ainda assim, recolhemos algumas informações que
partilhamos com os leitores mais interessados na esperança de
obtermos um retorno de informações sobre esta artista que há cerca
de 60 anos atrás gozou de alguma popularidade.
Maria de Pádua, à saída dos Correios em 1954. |
Maria de Pádua estreou-se na Emissora Nacional,
muito provavelmente em Novembro
de 1951 no programa "Passatempo", tendo (já depois de
tirar a carteira profissional no ano seguinte) continuado a vida
artística até pelo menos 1954, altura em que (numa entrevista)
confessara já estar desiludida com a vida artística, devido à falta
de oportunidades. Contudo, nessa mesma entrevista, simultaneamente
manifestava o seu desejo em “triunfar
custasse o que custasse, para depois se retirar com satisfação de
ter provado que possuía algum valor“. Ou seja, pelo que podemos perceber com tal afirmação, era bem
provável que por essa altura o fim da carreira artística e
discográfica de Maria de Pádua estivesse a atingir o seu limite,
não sendo alheio o facto de não se lhe conhecer nenhuma nova
gravação para o catálogo Alvorada durante toda a restante década de 50, senão
a recuperação de números antigos anteriormente gravados em 78 rpm
para a etiqueta Melodia (Dobadoira e Orvalhadas de S. João) mais
tarde incluídos num EP daquela editora lançado para o mercado em
1959, juntamente com outras duas interpretações de Maria Amélia
Canossa e do Conjunto de João Aleixo.
Facto
digno de registo é que Maria de Pádua cantava também em francês e
em italiano, tendo ainda no seu repertório números regionais,
género do qual terá sido uma das primeiras intérpretes. Não
obstante tal mediatismo, Maria de Pádua, sempre teve oposição da
família quanto à sua intenção de prosseguir com a vida artística,
sendo para nós uma incógnita qual o rumo que a sua carreira tomou
após 1954. Terá abandonado por vontade própria, descontente com o
panorama musical da época, face à emergência das primeiras vedetas
da canção ? Terá casado ? Terá emigrado para África na companhia
de um suposto marido ? Seria o nome de Mária de Pádua um nome
meramente artístico, face à abundância de “Marias” na
Emissora Nacional ? Não sabemos. Apenas sabemos que era funcionária
dos CTT, conforme já referimos anteriormente, exercendo o seu posto
na Praça dos Restauradores, em Lisboa. A respeito dos CTT não deixa
de ser curioso também que também nesse ano, foi gravado ainda para
a mesma editora um disco do Coral dos CTT. Teria Maria de Pádua
pertencido ao Coral dos CTT ? No referido disco, como era hábito na
altura, a ausência de informação era a regra geral e, para não
fugir à regra nenhuma referência à composição do coro
encontramos no referido disco, pelo que também essa pista pouco nos
ajudará de futuro. Resta-nos, mais uma vez e como já vem sendo
hábito, aguardar que algum leitor nos ajude a encontrar o paradeiro
desta artista, cujos excertos de duas canções aqui deixamos aos
nossos leitores.
Clique no Play para ouvir um excerto de "Dobadoira" e "S. João das Orvalhadas"
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